segunda-feira, 28 de maio de 2012

Modas do Cante Alentejano

A água, de ladeira acima,
Sem a lavarem não vai.
Se queres que eu seja tua
Vai-me pedir ao meu pai.

---

Ó alta serra da neve
Onde o penedo caiu,
Ninguém diga o que não sabe
Nem afirme o que não viu.

---

Quero cantar, ser alegre,
Que tristeza não faz bem.
'inda não vi a tristeza
Dar de comer a ninguém.

---

A chorar te disse adeus,
Lindo amor, quando te eu via
Pois confesso-te a verdade,
A chorar te amei um dia

Em Corais Alentejanos


sexta-feira, 25 de maio de 2012

Modas do Cante Alentejano

Estrada nova, estrada nova,
Estrada nova do pontão;
Por causa da estrada nova
Padece meu coração.

---

Eu não sei que simpatia
Meus olhos te vão tomando,
Quanto mais para ti olho,
Mais desejo estar-te olhando.

---

Eu hei-de mandar fazer,
Mas não sei se me farão;
Um barco de saudades,
Em teu peito uma estação.

---

O coração também chora,
Eu ainda não sabia.
Esta noite acordei eu
Ao pranto que o meu fazia.

Em Corais Alentejanos

quarta-feira, 16 de maio de 2012

Modas do Cante Alentejano

Amor é tufo no mundo;
Sem amor o que seria?!
Nem o sabor tinha gosto,
Nem o sorriso sorria!

---

Quem amor não tem na vida,
Não pode andar satisfeito
Que o amor é lei divina,
Não há nada mais direito.

---

Alegria de meus olhos
Eu não sei quem ma tirou
Tão alegre como eu era
Tão triste que agora sou.

---

Alegria duma quinta
É um verde laranjal!
A tristeza duma mãe
É um filho militar.

---

Anda lá, padece
Triste coração,
Arrecebe a paga
Que os amores dão.

Em Corais Alentejanos

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Modas do Cante Alentejano

A cana verde no mato
É sinal de fonte haver;
S'ê contigo nã' casar
Com outra nã' há-de ser.

---

A flor da fava é branca,
Ao longe faz aparência.
Para amar teu coração
É preciso ter paciência.

---

Vou-me embora, vou-me embora,
Vou-me embora já está dito
Vou colher a folha à rosa
E a semente ao manjerico.

Em Corais Alentejanos

sábado, 12 de maio de 2012

Modas do Cante Alentejano

Abre esta carta e verás
Dois passarinhos poisados
Faz de conta que sã' bêjos
Sã' bêjos por mim mandados

---

Ai! quem fosse borboleta
Voasse como ela voa!
Entrava no teu sentido,
Que o voar dela não sôa!

---

A cobra no verde mato
Foge que desaparece
Assim sâ' estes mês olhos
Ó pé de quem mos merece

---

Amanhã me vou embora
Prà terra das andorinhas
Mete carta no corrêo
Se queres saber novas minhas

Em Corais Alentejanos

sexta-feira, 11 de maio de 2012

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Modas do Cante Alentejano

Sou de Cuba natural,
E não me posso negar;
Toda a gente me conhece
Pelo modo de falar.

---

Em Moura tudo é bonito,
Em Moura tudo verdeja
Mas o Sol, que brilha em Moura
Primeiro passa por Amareleja.

---

Lá vai Serpa lá vai Moura
As Pias ficam no meio
Quando chego a Aldeia Nova
Não deve haver arreceio.

---

Monte de Dona Maria
Tem binte e quatro janelas
Bai uma pombinha branca
Apoisar em uma delas.

Em Corais Alentejanos

quarta-feira, 9 de maio de 2012

Modas do Cante Alentejano

Já não tenho pai nem mãe
Nem nesta terra parentes,
Sou filho das águas turvas,
Neto das águas correntes.

Ó minha mãe, minha mãe,
Ó minha mãe, minha amada,
Já perdi a minha mãe,
Já não faço gosto em nada.

"Variadas são as cantigas populares. As mais delas exprimem os sentimentos da pessoa humana. A paixão do amor tem especial relevo. Toda a gama de sentimentos que constituem a vida afectiva do indivíduo elas exprimem. O prazer e a dor, a alegria e a tristeza, o ódio, o ciume, a inveja, o desgosto, a resignação, a saudade, a melancolia, o orgulho, etc. tudo nelas se versa. Os próprios sentimentos- religioso, moral, intelectual, estético - aí se retratam."
A flora e a fauna da região, os astros, as produções agrícolas, as povoações, os diversos e variados trabalhos campestres (sementeiras, mondas, ceifas, debulhas),  e as estações ou quadras do ano em que se realizam, tudo é  motivo para ser cantado em verso.
Há cantigas humorísticas, sarcásticas e mordazes. Há-as irónicas, sentenciosas, anedóticas, de disputa ou desafio. Há outras que requerem cálculo, e ainda as de carácter filosófico, que é muito sua, filha da experiência."

José Francisco Pereira, em Corais Alentejanos

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Descrição ácerca de uma "Adiafa"

"Pelas adiafas da ceifa, ou em Fevereiro, quando se acaba na lagariça a mastuga da azeitona, se o lavrador é bizarro, mata-se na herdade um chibato barbão para ensopado, vêm as raparigas da aldeia e dos montes perto, e é um dia de festa entre a "cambada". Logo pela manhã, mastro no pátio, com festivas verduras de medronheiro, mentrastes, flores do monte; depois, na cozinha, o brasido de azinho e vides secas, as panelas, de roda, escachoando, os arrozes de olha gordos e toucinho, as orelheiras com couve e grãos durázios, e ao centro do lumaréu, na plena chama das vides, que dois ou três renovam, o enorme tacho onde a badana guisa, fedendo os seus fartuns de mato, entre batatas, pilhas de cebola, montes de salsa hortense a colorau."
"Enfim, coração lesto! o que há-de ser, será... - e os veludosos olhos da rapaziada beirã luzem com essa vaga doçura do vinho unido à pena, quando, sentados ainda de roda do almoço, ouvem no terreiro o adufe das moças alentejanas que os concitam..."

O rouxinol quando bebe,
Na fonte d'água corrente,
Tira penas com que escreve
Cartas ao amor ausente...

Em Antologia de Fialho de Almeida

sexta-feira, 4 de maio de 2012

Falares de Barrancos

Ê me lebantí da cama logu p'la manhã, bebí u café com pãu i quêju. Dehpoi fi p'rò trabalhu: çacá trigu p'rà êra, i gahtí trê Z ora; dehpôi fui almuçá, i logu fi a buhcá ôtru biaje, i ôtru, áta áh dua Z ora, i logu fi a jantá, i dehpoi fi a buhcá ôtru biaje, i açim at'á noite.

(homem de 28 anos)

U primêru que fi, foi labá-me a cara; logu dehpoi tumí u cafelitu, i dehpoi mê pu a amaçáR u pãu i agora ehperei que çe fintára; i 'tandu finta, aquèçi u fornu, meti-u dentru p'ra que cuzeçe.

(rapariga)

Hoje termino, ou melhor, interrompo a temática do dialecto barranquenho, no que me apoiei na obra do filólogo José Leite de Vasconcellos. Considero este tema apaixonante e uma pena que os falares de Barrancos se venham a perder, destino esse que, presumo, será inevitável.

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Uma Estória barranquenha

Má sorte de um lôbo

Era uma porca com çeti bacurinhu' logu beyu um lôbu, i ç'u queria cumê; i ela le diçe:
-Nã tão ainda bautizadu'; bâmu bautiza-lu' á fonti, i tu eri u padrinhu.
Eli çe pô ençima du burcá i a porca, au dá-li u' bacurinhu' tirô com êli ("o lôbo") para dentru do pôçu, i ela çe foi. I u lobu nu fim de tre' dia' çaiu, i çe fôi um caminhu atianti; ç' encontrô uma égua com maxinhu', i le diçe:
-Agora comu-te u' maxinhu', porque tenhu munta fómi.
A égua rehpondeu:
-Não, tira-me primêru ehti picu.
I ela lebantô a páta para lu tirá, i le deu um côçi na cabeça.
Di u lôbu:
-Quei me fê a mi batizadô de bácuru', e tiradô de picu? Que raiu que mi partiçi!
Ç'arrimô a uma azinhêra. I êhtaba um omê curtandu; le caíu uma pêrnada ençima, i ali ficou mortu u lôbu.

(burcá = bocal do poço; maxinhu = mulo recêm-nascido))

(Recolhida em 1939)
Em Filologia Barranquenha


terça-feira, 1 de maio de 2012

Ary dos Santos



«…Serei tudo o que disserem
por temor ou negação:
Demagogo mau profeta
Falso médico ladrão
Prostituta proxeneta
Espoleta televisão.
Serei tudo o que disserem:
Poeta castrado não!»