quinta-feira, 4 de julho de 2013

Encerramento

Dia 20 de Maio, é a data em que publiquei a última postagem no rimapontocom. Nessa data não previa que o blog chegara ao fim. Para que conste, faço hoje o encerramento formal.

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Arminda Gonçalves

Se Fosse Possível

Se eu pudesse vencer
os demónios que passam num cortejo
de risos e de gritos;
se eu pudesse viver
sem medo,  sem assombros, sem desejo
de ressurgir os sonhos infinitos; os sonhos que em mim trago
emersos e insepultos
quais folhas mortas a boiar num lago!

(...)

Em chama reacendida

terça-feira, 23 de abril de 2013

Arminda Gonçalves

No limiar da noite

Um escuro crepúsc'lo. São, agora,
quase pretas as velas das fragatas
e os navios, no cais, a esta hora,
guardam no fundo bojo as mais abstractas

e inconcebíveis ânsias. Apavora
a cor das águas. Fosforecem pratas
e ourescentes sinais ao longe. E, embora,
a noite surja, as sombras são exactas.

Marcam no espaço riscos geométricos
as gaivotas. As duas largas margens
do rio são exóticas paisagens.

Passam na rua lívida os eléctricos
cheios de gente. E a noite é como um grito
tumultuoso de ânsia e de infinito.

Em chama reacendida


sábado, 20 de abril de 2013

Arminda Gonçalves

Ainda...

Por mágica fortuna me transporto
ao rio irado em cuja margem suave
encontro o meu porto
e abri a asas de incansável ave.

O fascínio de então, a chama viva
que eu própria era, e aquele olhar aberto
à paisagem anímica e festiva,
como hoje estão de mim tão longe e perto!

O mesmo apelo à vida ainda sinto
na perturbante seiva que percorre
as minhas veias. Bebo o mesmo absinto...
e a minha sede não se farta ou morre.

Ainda aquela origem milagrosa
no frémito da voz que me aturdiu!
E não murchou a flor maravilhosa
que a Primavera abriu!

Parou o Tempo. O espírito persiste,
fascinado a adorar a juventude.
O mesmo amor, a mesma fé subsiste
na mesma plenitude!

Em chama perdida

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Donabela Guerreiro

Momentos - III

Um dia nascerá um sol novo
que dará mais brilho
ao vermelho das papoilas
que desabrocham livremente
nos campos doirados de trigo.
Haverá alegria e pão,
uma nova música nascerá.
Os homens comunicarão nesta linguagem
e as crianças brincarão às rodas,
num prado verde de esperança
e então, todos de mãos dadas
cantaremos o futuro
numa roda do tamanho do mundo.

Em A Mulher as flores o futuro

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Lília da Silva

Do chão se levanta
Este odor a terra molhada
A fundir-se com a violência
Das chuvas
Nas vidraças quebradas.

Em A Mulher as flores o futuro

quarta-feira, 17 de abril de 2013

Lília da Silva

Fusão

Gota a gota, hora a hora, uma fonte
Goteja, pródigas, as suas lágrimas.
Amor é palavra líquida que sacia
Ainda que não saiba quem dela vai beber.

Amor é não sentir o peso
Das asas da ave mais próxima,
É palavra na qual
Com alegria se morre.

E, como uma chama consome a solidão,
Das cinzas frias a alegria brota
Nas entranhas de uma tocha interior.

É um sonho exacto,
Sonho de ver parar o mundo
E de pedir um sol. Hoje, só hoje.

Roubei do sol pela manhã
E do luar pela madrugada
A luz que trazia toda nas minhas mãos.
Quando fui deixá-la nos teus olhos
Tinha-se escapado por entre meus dedos.
Estou vazia.

Em A Mulher as flores o futuro

segunda-feira, 15 de abril de 2013

Das danças dos "mastros"

Noutro tempo tinha eu
Nesta rua uma cadeira
Onde assentavam meus olhos
Agora vão de carreira!

"Para bailar o rapaz e a rapariga colocavam-se lado a lado e davam as mãos, cruzando os braços. Uma vez formado o par, entravam numa roda de pares à volta do "mastro". Cantavam em coro à medida que rodavam lentamente, sem preocupação de ritmo. Uma voz a solo, masculina ou feminina, entoava uma quadra que podia ser, ou de elogio à namorada, ou de brincadeira, de provocação ou até saudosista."
Assim, Hélder Mendes, natural de Ourique, descreve a tradição popular do "mastro", na região de Ourique, nos Cadernos Culturais d'Ourique, edição de 2012.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

Rosa Maria Cruz

Por mim

Arranca de ti aquilo que te
                                    queima.
Queima aquilo que te seca.
Mas...
deixa germinar o que
                           conserva.

Em A Mulher as flores o futuro

quarta-feira, 10 de abril de 2013

Rosa Maria Cruz

Tarde

Cai a tarde mansinha
quente e aflitiva,
cai sobre a aldeia branca e
pequenina,
envolvendo numa bruma
silenciosa, calma e doce!

Cai ao de leve com uma suave
brisa
que empurra brincando
os frouxos ramos,
e nos traz o seu fresco aroma.
Ouve~se um melodioso som
cortando a quietude e o silêncio,
ouve-se ao longe, vago, cada vez
mais vago
vago, sim!
Como o ondular das searas
douradas pelo sol
pelo sol que se vai escondendo
demoradamente, silenciosamente!...
Pelo sol
que nos dá luz, vida
e cor!
Pelo sol, que nos deixa a noite
quente e, que à tarde nos abrasa
calorosamente.

Em A Mulher as flores o futuro

terça-feira, 9 de abril de 2013

Rosa Maria Cruz

"Sonhei"

Sonhei um dia...
Com um mundo lindo e justo
Em que a natureza era tudo,
Em que as árvores e o céu se tocavam
Num gesto espontâneo,
Em que o sol brilhava para todos,
E o céu se tingia de vermelho
Ao entardecer.
Em que o tapete verde
De esperança
Cobria a terra onde
Os Homens eram iguais.

Aí a paz era uma constante
Do dia a dia
E a guerra não existia!

Mas... sonhei apenas!...

Em A Mulher as flores o Fruto, editado pelo Grupo Cultural de S. Domingos

sábado, 6 de abril de 2013

Cecília Meireles

Minha canção não foi bela,
minha canção foi só triste.
Mas eu sei que não existe
mais canção igual àquela.

Não há gemido nem grito
pungente como a serena
expressão da doce pena.

E por um tempo infinito
repartiria o meu canto
- saudosa de sofrer tanto.

terça-feira, 2 de abril de 2013

Francisco Miguel

Tens um feitio de arradia
às vezes de mau humor
és como aquela que via
mais de noite que de dia
e contudo tinha amor

És uma contradição
muito bem politizada,
mas tens um bom coração
dizes sim ou dizes não
mais ou menos irritada.

(Versos dedicados à Ana Benedita)

domingo, 31 de março de 2013

Zé Mota

Às vezes rija e dura
Sempre sensível e humana
Mesmo azeda tens ternura
Todos te chamam a Ana
És árvore que não abana
És como as côdeas do pão
Ásperas, duras mas gostosas
Também há picos nas rosas
Também há pedras no chão
Abres sempre o coração
Ao trabalho e ao cansaço
Não tens filhos no regaço
Mas sentes as dores alheias
Na seara que semeias
O seu fruto não engana
Se te perguntam quem és
Respondes: Eu sou a Ana.

O autor é o José Machado Moreira Rita, tratado por Zé Mota, Nome que durante anos eu tive por seu, verdadeiro. Afinal  era o seu nome de guerra! Escreveu este poema que dedicou à Ana Benedita, sua amiga e camarada de luta. Conheci o saudoso Zé Mota e conversamos muitas vezes. Conheço a Ana Benedita que, apesar de termos estado nas mesmas salas, nos mesmos eventos, vezes sem conta, nunca surgiu ocasião para trocarmos qualquer palavra. Do que presenciei da Ana, do que dela dizia, com ternura, a Conceição Morais, ler este poema do Rita, é identificar sem sombra de dúvida a personalidade da homenageada, a quem felicito pelo testemunho que nos oferece com as suas Vivências.

quinta-feira, 28 de março de 2013

Francisco Miguel

Tens sangue de camponesa
Coração puro e isento
Falas sempre com franqueza
Apesar da tua aspereza
Tens sempre bom sentimento.

Dedicado pelo autor a Ana Benedita Ramos Caro

domingo, 17 de março de 2013

Martinho Ambrósio Ruivo

Doze anos namorei
Que se conte mais algum
Nova vida arranjei
Casei em sessenta e um.

Este é o mote de umas décimas escritas pelo senhor Martinho, de Évoramonte, nas quais descreve o seu casamento, aos 32 anos, com a senhora Aurélia Inácia Simões Saias.

quinta-feira, 7 de março de 2013

Fernando Pessoa

O manjerico comprado
Não é melhor que o que dão.
Põe o manjerico ao lado
E dá-me o teu coração.

Rosa verde, rosa verde...
Rosa verde é coisa que há?
É uma coisa que se perde
Quando a gente não está lá.

Andorinha que passaste,
Quem é que te esperaria?
Só quem te visse passar
E esperasse no outro dia.

sexta-feira, 1 de março de 2013

Grândola, Vila Morena

Grândola, vila morena
Terra da fraternidade
O povo é quem mais ordena
Dentro de ti, ó cidade

Dentro de ti, ó cidade
O povo é quem mais ordena
Terra da fraternidade
Grândola, vila morena

Em cada esquina um amigo
Em cada rosto igualdade
Grândola, vila morena
Terra da fraternidade

Terra da fraternidade
Grândola, vila morena
Em cada rosto igualdade
O povo é quem mais ordena

À sombra duma azinheira
Que já não sabia a idade
Jurei ter por companheira
Grândola a tua vontade

José Afonso

sábado, 23 de fevereiro de 2013

Fernando Pessoa

A rosa que se não colhe
Nem por isso tem mais vida.
Ninguém há que te não olhe
Que te não queira colhida.

Tenho vontade de ver-te
Mas não sei como acertar.
Passeias onde não ando
Andas sem eu te encontrar.

Vai alta a nuvem que passa.
Vai alto o meu pensamento
Que é escravo da tua graça
Como a nuvem o é do vento.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Fernando Pessoa

O vaso que dei àquela
Que não sabe quem lho deu
Há-de ser posto à janela
Sem ninguém saber que é meu.

O malmequer que arrancaste
Deu-te nada no seu fim,
Mas o amor que me arrancaste,
Se deu nada, foi a mim.

Teu xaile de seda escura
É posto de tal feição
Que alegre se dependura
Dentro do meu coração.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Fernando Pessoa

Tens uma rosa na mão.
Não sei se é para me dar.
As rosas que tens na cara,
Essas sabes tu guardar.

Levas uma rosa ao peito
E tens um andar que é teu...
Antes tivesses o jeito
De amar alguém, que sou eu.

Tens um livro que não lês,
Tens uma flor que desfolhas;
Tens um coração aos pés
E para ele não olhas.

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2013

Fernando Pessoa

Quadras Populares

Teus olhos tristes, parados,
Coisa nenhuma a fitar...
Ah meu amor, meu amor,
Se eu fora nenhum lugar!

Em vez da saia de chita
Tens uma saia melhor.
De qualquer modo és bonita,
E o bonita é o pior.

Teus brincos dançam se voltas
A cabeça a perguntar.
São como andorinhas soltas
Que ainda não sabem voar.

sábado, 9 de fevereiro de 2013

Fernando Pessoa

Um dos maiores poetas portugueses de todos os tempos, o celebrado Fernando Pessoa, na sua formidável obra deixou-nos também poesia de inspiração popular sob a forma Quadras Populares. No total serão algumas centenas de Quadras, com a particularidade de a esmagadora maioria ter sido escrita já no final da sua vida, ou seja, depois da vasta obra de natureza culta, dramática, mística, especulativa. Pessoa não desdenhou fazer poesia "menor", segundo as suas próprias palavras (Ou terá sido um descer voluntário, portanto, ao grau 0 da poesia, depois de ter atingido o mais elevado grau da sua escala de valores - o de poeta dramático, segundo Luísa Freire?).
Iremos inscrever neste sítio algumas dessas Quadras Populares.

Tens o leque desdobrado
Sem que estejas a abanar.
Amor que pensa e que pensa
Começou ou vai acabar.

Toda a noite ouvi no tanque
A pouca água a pingar.
Toda a noite ouvi na alma
Que não me podes amar.

Trazes a rosa na mão
E colheste-a distraída...
E que é do meu coração
Que colheste mais sabida?

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Francisco Miguel

Temos homens de talento

Temos homens de talento
amantes da discussão
que falam do sofrimento
fazem discursos ao vento
mas temem a revolução.

Em sua filosofia
querem as tardes amenas
e que a "pobre burguesia"
quando tiver cair
venha a cair sobre penas.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Amália

A Grande Amália cantou os melhores poetas. Ary dos Santos foi um deles. Com Alain Oulman, Amália formou uma parceria que deixou uma obra memorável.

quinta-feira, 31 de janeiro de 2013

Carminho mais Chico Buarque

Carminho é uma das jovens interpretes do fado, com uma voz sublime, a ensaiar parcerias de luxo. Neste vídeo com a lenda viva brasileira Chico Buarque.

terça-feira, 29 de janeiro de 2013

Francisco Miguel

Porque não pode ser

Te requer meu pensamento.
Repele-te o coração.
Tem o SIM assentimento
forçando meu sentimento.
Só te posso dizer NÃO.

De amor não deste a semente
de amor és só duvidar.
Um amor que nunca sente
que outro coração pode amar?

Dúvida és permanente
dúvida que causa dor.
Dói amor quando é ardente
amor frio causa ardor.

sexta-feira, 25 de janeiro de 2013

Luísa Basto


Francisco Miguel

O Poeta

O poeta é um cavador
que cava fundo na vida.
Às vezes descobre a dor
onde ninguém vê a ferida.

Larga janela da casa
deixa entrar a luz do dia
janelas no sentimento
ilumina o pensamento
pode-nos dar poesia.

Sabendo não ser poeta
quis contudo fazer versos.
Tentativa ou descoberta
é janela sempre aberta
a receber pura luz
de invisíveis universos.

A poesia da vida
é de todas a mais bela.
Mais sentida mais vivida
permanente ou de fugida
gosto de estar com ela.

quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

Francisco Miguel

A luta é o caminho

Nossa luta é o caminho
que melhor leva à cidade.
Não queiras lutar sozinho
nem esgrimir contra moinhos
na luta por liberdade.

Quem luta sempre com massas,
em ligação com o povo,
seja velho ou seja novo
fará mais do que "fumaças".

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Francisco Miguel

Saúde não me abandones

Não me abandones, saúde
dá-me mais força e vigor
dá-me mais de juventude
de ser sempre um lutador.

Que nunca venha a fraqueza
e a falta de energia
porque lutar com firmeza
dá à vida mais grandeza
e muito mais alegria.

Saúde não me abandones
dá-me sempre mais vigor;
dá-me dobrada energia
para viver o amor
que nasce do novo dia.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Francisco Miguel

Confissão

Já versos não sei fazer
tenho o talento perdido,
se não escrevo o já sabido
nada mais posso escrever.

Para falar de flores
do lindo verde das árvores,
do silêncio e do ruído
terei de falar de amores
e disso estou proibido.

Está restrita a liberdade,
por lei da boa razão,
aos homens da minha idade
terem dores de coração.

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Francisco Miguel

Amor e Fumo

Do seu cigarro subia
cordão de fumo ondulado.
Fumando, leve sorria
numa expressão que dizia
algo de mim ter pensado.

Chupando no seu cigarro
cuja ponta se avivava.
Naquela pequena brasa,
deitando fumo e calor,
ia subindo o amor
no fumo que se elevava.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Francisco Miguel

O Camponês

Com a enxada ou enxadão,
faça Sol ou faça chuva
faz a terra dar trigo
e faz a cepa dar uva.

Por isso p'ró camponês
deve ir o nosso carinho
e a nossa grande afeição.
Do camponês vem o vinho
do camponês vem o pão.

Onde vires um camponês
considera-o teu amigo.
o camponês cava o chão
faz a terra dar o trigo.

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

Francisco Miguel

Penso em Ti...

Teu rosto sempre me atrai
como a borboleta uma luz;
mas que todo o peito abrasa
com o calor que produz.

Na tua pele morena
vejo a minha já queimada.
Tua tristeza serena,
que me abrasa e não queima,
é como a cinza apagada.

O poeta busca a forma
de exprimir a sua dor;
sem amor não se conforma;
faz poemas por amor.

quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Francisco Miguel

Baleizão é Minha Terra

Baleizão é minha terra
é terra de gente boa
quer a paz não quer a guerra
exige paz a Lisboa.

Novo Sol, novo horizonte
há mais luz-claridade
Baleizão em tua fronte
está escrito liberdade.

Campos verdes - os trigais
terra-pão não há fartura
seremos todos iguais
com mais pão e mais cultura.

Baleizão é tua sina
teres um povo combatente
tu tiveste Catarina
e Catarina é toda a gente.