quinta-feira, 12 de abril de 2012

Domingos Fialho Barreto

O Pescador:
Sou dos lados de Milfontes
Minha labuta é no mar
Com a morte sempre à vista
Onde há lindos horizontes
Minha labuta é no mar
Sou dos lados de Milfontes

O Mineiro:
Nos Lombadores em Padrões
Na mina vou trabalhar
Nas profundezas da terra
Sujeito a mil baldões
Nos Lombadores em Padrões

O Lenhador:
Faço lenhas e carvão
Subo às árvores pràs cortar
Tenho a desgraça a um passo
Se delas cair ao chão
Subo às árvores pràs portar
Faço lenhas e carvão

O Pescador:
As friezas e maresias
Nunca me vão perdoar
Sinto as juntas rangendo
São dores de noite e de dia
Nunca me vão perdoar
As friezas e a maresia

O Mineiro:
Aquele pó do minério
Já sei que me vai matar
Vou sentindo o peito seco
Só me resta o cemitério
Já sei que me vai matar
Aquele pó do minério

O Lenhador:
Eu tenho mesmo destino
Já me custa a respirar
É esse gás do carvão
Junto ao pó negro e fino
Já me custa a respirar
Eu tenho mesmo destino

O Pescador:
Desde que o barco solta
Seja ou não a remar
São redes linhas e bóias
Dá-se mil e uma volta
Seja ou não a remar
Desde que o barco solta

O Mineiro:
Ganhar o pão é custoso
O mineiro não tem par
Rebentando a dura pedra
Só ar quente e humidoso
O mineiro não tem par
Ganhar o pão é custoso

O Lenhador:
Arrancada uma azinheira
Tem trabalhos a dobrar
Picar galhos serrar toros
Pró abegão e lareira
Tem trabalhos a dobrar
Arrancada uma azinheira

O Pescador:
Igual aos pombos-correios
Tenho de me orientar
Seja de noite ou de dia
Às vezes com mil rodeios
Tenho de me orientar
Igual aos pombos-correios

O Mineiro:
A mina é uma masmorra
Condenado pra ganhar
O pão do dia-a-dia
Estou eu até que morra
Condenado pra ganhar
A mina é uma masmorra

O Lenhador:
Quase não ganho prà roupa
Sujo estou por mais lavar
Os lenhos tudo me rompem
Sabendo que tenho pouca
Sujo estou por mais lavar
Quase não ganho prà roupa

O Pescador:
Chega de lamentações
Só já nos falta chorar
Falando das nossas vidas
Sem ver causas nem razões
Só já nos falta chorar
Chega de lamentações

O Mineiro:
A causa está à flor
Nem é preciso pensar
É o poder explorando
Sem justiça nem amor
Nem é preciso pensar
A causa está à flor

...

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